Associação dos Pesquisadores Científicos do Estado de São Paulo (APqC) fez uma denúncia à Agência Brasil sobre a presença de barbeiros, insetos conhecidos por se alimentarem do sangue de humanos e animais, encontrados no Instituto Butantã. No último trimestre de 2024, dois desses insetos foram capturados no pavilhão Lemos Monteiro, um prédio centenário adaptado para laboratórios de pesquisa. Ambos os espécimes estavam infectados com o protozoário Trypanosoma cruzi, causador da Doença de Chagas, o que levanta preocupações sobre a vigilância sanitária na região.
Patricia Clissa, pesquisadora da APqC, informou que durante uma vistoria realizada pela vigilância em saúde da prefeitura, foram encontrados mais dez barbeiros em outra área do instituto, com dois deles também contaminados. Além disso, o Campus Butantã da USP, que abriga cerca de 70 mil estudantes e funcionários, registrou a presença de pelo menos seis barbeiros no final do ano passado. Essa situação destaca a necessidade urgente de monitoramento e controle da população desses insetos na área.
O Butantã é um bairro que abriga animais silvestres, como saruês, que são reservatórios naturais do Trypanosoma cruzi. Com uma população de mais de 350 mil habitantes, a região possui corredores ecológicos que se estendem pela metrópole, facilitando o contato entre os barbeiros e os humanos. A urbanização crescente, com a construção de prédios e a retirada de vegetação, tem alterado o habitat natural dos saruês, aumentando o risco de infecções.
Helena Dutra Lutgens, presidente da APqC, expressou sua preocupação com a falta de ações efetivas por parte da Secretaria da Saúde. Ela alertou que, se não forem tomadas medidas para informar a população e reestruturar as atividades da Superintendência de Controle de Endemias (Sucen), pode haver um aumento no número de infecções humanas. A situação é alarmante, considerando que a Sucen foi extinta em 2020, e suas funções foram transferidas para outras coordenadorias, o que compromete a vigilância e o controle da doença.
Entre 2014 e 2019, a Sucen catalogou mais de uma centena de barbeiros, mas o monitoramento parece ter sido descontinuado. A falta de um acompanhamento adequado impede a detecção de possíveis contatos entre animais infectados e humanos, o que é crucial para evitar a propagação da Doença de Chagas. A APqC enfatiza a necessidade de um retorno ao controle ativo e à pesquisa sobre a presença desses insetos na região.
A Secretaria de Estado da Saúde informou que monitora a circulação do Trypanosoma cruzi na metrópole desde 2019 e que, até o momento, não foram registrados casos de infecção em humanos na área urbana. Técnicos da Coordenadoria de Controle de Doenças (CCD) estão capacitando agentes de saúde para identificar os barbeiros e realizar exames para verificar a presença do protozoário. No entanto, a eficácia dessas ações ainda é questionada pela APqC.
Sobre o Instituto Butantã, a secretaria afirmou que o aparecimento dos barbeiros foi considerado um caso isolado, e o monitoramento continua com uma equipe técnica contratada. A Secretaria Municipal da Saúde também está atenta à ocorrência de triatomíneos na região, mas não há evidências de transmissão da Doença de Chagas na capital paulista. A vigilância está em andamento, e medidas de prevenção estão sendo recomendadas à população.
A Doença de Chagas é uma infecção negligenciada que afeta milhões de pessoas, principalmente na América Latina. Causada pelo Trypanosoma cruzi, a doença pode ser assintomática ou se manifestar em formas crônicas, como cardíaca e digestiva. A subnotificação é comum, com estimativas indicando que 70% a 90% dos casos não são diagnosticados. A contaminação alimentar por fezes de barbeiros é uma das principais formas de transmissão, o que torna a vigilância e o controle ainda mais essenciais.